A notícia de que o Brasil bateu recorde de pedidos de demissão em 12 meses mostra que o fenômeno “The Great Resignation” (algo como A Grande Renúncia ou A Grande Demissão), identificado nos EUA e na Europa, já chegou por aqui.
Além de causar estranheza, uma vez que o Brasil mantém altas taxas de desemprego (11,2%, ou 12 milhões de brasileiros), esse fenômeno nos fez pensar em como os conceitos de Marca Empregadora (Employer Branding) e EVP (Employer Value Proposition) são cada vez mais importantes para que as empresas retenham talentos, atraiam os profissionais mais qualificados do mercado e garantam a sustentabilidade do negócio e de sua reputação.
Na sopa de letrinhas em voga hoje em dia, depois do ESG (que trata da sustentabilidade Ambiental, Social e de Governança), o EVP também tem se tornado uma sigla bem popular no mercado corporativo e significa “proposta de valor ao empregado”. Na prática, é aquele pacote de vantagens competitivas que uma empresa oferece para atrair potenciais candidatos e reter colaboradores de alta performance.
Claro que uma boa remuneração faz parte de um pacotão de vantagens. Mas com a inflação nas alturas, as empresas estão sendo desafiadas a repensar estratégias realmente competitivas. É aí que entram os cinco pilares do EVP: compensação, benefícios, plano de carreira, ambiente de trabalho e cultura organizacional.
Esses pilares mostram que pouco adianta oferecer um bom salário e benefícios se a empresa não garante um ambiente de trabalho saudável, propício para o desenvolvimento de habilidades e com uma cultura que fortaleça os valores da marca no dia a dia. Isso sem falar no planejamento de carreira, afinal, todo mundo tem expectativas para o futuro.
Cada companhia pode estipular um modelo próprio de EVP, mas antes de decidir o que entra nesse pacote, vale a pena entender o porquê dessa onda de demissão voluntária e o que, realmente, os trabalhadores querem hoje em dia
Beyoncé captou o espírito do tempo
Nos EUA, a Grande Demissão está tão em alta que ganhou até um hino: “Break my Soul”, o single de Beyoncé lançado em junho de 2022, conversa com os milhões de americanos que deixaram seus empregos em 2021 em busca de melhores oportunidades:
“Now I just fell in love / And I just quit my job / I’m gonna find new drive / Damn they work me so damn hard / Work by nine / Then off past five / And they work my nerves / That’s why I cannot sleep at night”
Dizem os versos, que na tradução livre seria: “Agora eu me apaixonei / E acabei de sair do meu emprego / Vou encontrar um novo estímulo / Droga, eles me fizeram trabalhar tão duro / Trabalho às nove / E depois da cinco / E eles me irritam / É por isso que não consigo dormir à noite.”
Outra parte da música destaca as frustrações dos trabalhadores que lutam contra baixos salários, longas horas de trabalho e inflação crescente:
“Release ya anger, release ya mind /Release ya job, release the time /Release ya trade, release the stress /Release the love, forget the rest”
Que seria: “Libere sua raiva, libere sua mente / libere seu emprego, libere o tempo/ Libere o negócio, libere o estresse / Libere o amor, esqueça o resto.”
Certamente, Queen B estava pensando nas mazelas dos americanos quando lançou a canção. Mas diante da crise econômica global, ela fala alto aos desejos de grande parte dos brasileiros.
O curioso é que o público brasileiro que está pedindo demissão é diferente do público americano. Segundo a consultoria organizacional Blue Management Institute (BMI), que em abril fez uma pesquisa sobre a onda de demissões voluntárias no Brasil, os pedidos de demissão têm ocorrido com maior intensidade numa fatia mais elitizada da sociedade, uma mão de obra qualificada, com ensino superior completo, que busca uma atividade que proporcione maior realização pessoal.
Já nos EUA, o desejo de pedir as contas parte, na maioria das vezes, de funcionários da base da pirâmide. De acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), 70% da “Grande Demissão” americana é formada por mães, que se viram obrigadas a deixar o trabalho diante das incertezas e interrupções nas escolas e creches (principalmente aquelas com filhos menores de cinco anos) e trabalhadores mais velhos, que estariam aproveitando as turbulências pandêmicas para se aposentar.
O isolamento social da pandemia, aliás, acentuou a tendência de debandada dos trabalhadores que já estava em curso nos EUA há quase uma década. Durante o isolamento social, as pessoas repensaram a vida e muita gente mudou sua visão do trabalho, identificando novas possibilidades, como o home office e outros modelos mais flexíveis. Um estudo do LinkedIn aponta que 49% dos entrevistados estão considerando mudar de emprego em 2022. Essa porcentagem é ainda mais alta para os jovens de 16 a 24 anos (61%). Os dois principais motivos são a busca por melhores salários e o desejo por um maior equilíbrio entre a vida pessoal e profissional.
Outra pesquisa do LinkedIn mostra que 78% dos profissionais afirmam que a pandemia fez com que passassem a querer ou a precisar de mais flexibilidade no trabalho. Cerca de 30% dos entrevistados garantem que deixaram seus empregos por falta de políticas flexíveis no último ano e quase 40% já consideraram essa possibilidade em algum momento da carreira.
Além disso, a pesquisa da BMI ainda aponta dois fatores principais para A Grande Demissão aqui no País: a busca por uma melhor condição financeira, que sustenta a busca por vagas no modelo híbrido (54,2%); e a fuga de uma “cultura corporativa tóxica”, destacada por 52,1% dos entrevistados e baseada na ausência de diversidade, equidade e inclusão nas companhias, além de uma sensação de desrespeito com os funcionários.
Quebrando a cabeça por um EVP atraente
No “contra-ataque” das empresas, as principais medidas que os departamentos de RH estão tomando, ainda de acordo com o relatório da BMI, são: desenhar oportunidades de carreira com crescimento horizontal, além do vertical (43,8%); reduzir pré-requisitos de entrada e aprimorar os pacotes de remuneração e de benefícios flexíveis (33,3% cada um).
Polêmicas, as semanas mais curtas de trabalho também têm sido testadas como um belo investimento no EVP em algumas marcas. No Reino Unido, dezenas de empresas estão participando da “Campanha Semana de 4 dias de trabalho”. Trata-se de um experimento de seis meses, organizado pela ONG 4 Day Week Global, em parceria com o think tank Autonomy e pesquisadores das universidades de Cambridge, Oxford e Boston, que monitoram os resultados. De junho a dezembro desse ano, os colaboradores das empresas vão trabalhar apenas 32 horas por semana com os mesmos salários e benefícios. A aposta é a de que haverá ganho de produtividade para o empregador e qualidade de vida para os empregados.
Entre 2015 e 2021, a Islândia fez teste semelhante, com aproximadamente 2,5 mil servidores públicos, ou 1% da população economicamente ativa. A jornada foi reduzida de 40 para 35 horas. Experimentos parecidos foram realizados no Japão, pela Microsoft, e na Nova Zelândia, pela Unilever. No Brasil, a moda ainda não pegou, mas algumas empresas já estão experimentando o final de semana prolongado.
Mas aqui na Ecomunica, a gente acredita que oferecer uma boa proposta de valor para colaboradores e potenciais candidatos vai além dessas novidades. O EVP é também um processo interno que se conecta diretamente com a percepção que outros stakeholders terão da sua marca. Afinal, toda empresa quer que seus colaboradores se tornem embaixadores.
Antes de pensar num kit de boas-vindas Instagramável (ou “LinkedInável”), é fundamental compreender o quanto das “promessas” feitas para atrair novos talentos são, de fato, cumpridas. Por exemplo, algumas empresas dizem abraçar a diversidade e prezar pela inclusão, mas no dia a dia isso acaba se perdendo por não existir um plano de ações concretas com esse foco. Nesse cenário, aqueles que não se sentem acolhidos, por vezes, acabam indo em busca de novas oportunidades.
Uma marca empregadora fortalecida se destaca no mercado, chamando a atenção de investidores e dos consumidores finais, que querem se relacionar com marcas que dialogam com seus próprios interesses, como a responsabilidade social, por exemplo. E é incoerente se vender como uma empresa preocupada com esse aspecto, se o ambiente e as dinâmicas de trabalho não favorecem as pessoas – parece óbvio dizer que são pessoas, mas é que muitas empresas tratam seus colaboradores como números.
Nós acreditamos que o EVP se relaciona com a reputação corporativa, que é diretamente impactada pelo conceito de marca empregadora. Isso porque é pouco provável que uma companhia consiga prosperar e escalar suas operações sem um time de colaboradores qualificados. É preciso, portanto, comunicar ao mercado o que se tem feito estruturalmente. Só que, antes, é necessário começar de algum lugar – e esse lugar é a verdade das boas práticas acontecendo no dia a dia, “dentro de casa”.?
Quebrando a cabeça por um EVP atraente
No “contra-ataque” das empresas, as principais medidas que os departamentos de RH estão tomando, ainda de acordo com o relatório da BMI, são: desenhar oportunidades de carreira com crescimento horizontal, além do vertical (43,8%); reduzir pré-requisitos de entrada e aprimorar os pacotes de remuneração e de benefícios flexíveis (33,3% cada um).
Polêmicas, as semanas mais curtas de trabalho também têm sido testadas como um belo investimento no EVP em algumas marcas. No Reino Unido, dezenas de empresas estão participando da “Campanha Semana de 4 dias de trabalho”. Trata-se de um experimento de seis meses, organizado pela ONG 4 Day Week Global, em parceria com o think tank Autonomy e pesquisadores das universidades de Cambridge, Oxford e Boston, que monitoram os resultados. De junho a dezembro desse ano, os colaboradores das empresas vão trabalhar apenas 32 horas por semana com os mesmos salários e benefícios. A aposta é a de que haverá ganho de produtividade para o empregador e qualidade de vida para os empregados.
Entre 2015 e 2021, a Islândia fez teste semelhante, com aproximadamente 2,5 mil servidores públicos, ou 1% da população economicamente ativa. A jornada foi reduzida de 40 para 35 horas. Experimentos parecidos foram realizados no Japão, pela Microsoft, e na Nova Zelândia, pela Unilever. No Brasil, a moda ainda não pegou, mas algumas empresas já estão experimentando o final de semana prolongado.
Mas aqui na Ecomunica, a gente acredita que oferecer uma boa proposta de valor para colaboradores e potenciais candidatos vai além dessas novidades. O EVP é também um processo interno que se conecta diretamente com a percepção que outros stakeholders terão da sua marca. Afinal, toda empresa quer que seus colaboradores se tornem embaixadores.
Antes de pensar num kit de boas-vindas Instagramável (ou “LinkedInável”), é fundamental compreender o quanto das “promessas” feitas para atrair novos talentos são, de fato, cumpridas. Por exemplo, algumas empresas dizem abraçar a diversidade e prezar pela inclusão, mas no dia a dia isso acaba se perdendo por não existir um plano de ações concretas com esse foco. Nesse cenário, aqueles que não se sentem acolhidos, por vezes, acabam indo em busca de novas oportunidades.
Uma marca empregadora fortalecida se destaca no mercado, chamando a atenção de investidores e dos consumidores finais, que querem se relacionar com marcas que dialogam com seus próprios interesses, como a responsabilidade social, por exemplo. E é incoerente se vender como uma empresa preocupada com esse aspecto, se o ambiente e as dinâmicas de trabalho não favorecem as pessoas – parece óbvio dizer que são pessoas, mas é que muitas empresas tratam seus colaboradores como números.
Nós acreditamos que o EVP se relaciona com a reputação corporativa, que é diretamente impactada pelo conceito de marca empregadora. Isso porque é pouco provável que uma companhia consiga prosperar e escalar suas operações sem um time de colaboradores qualificados. É preciso, portanto, comunicar ao mercado o que se tem feito estruturalmente. Só que, antes, é necessário começar de algum lugar – e esse lugar é a verdade das boas práticas acontecendo no dia a dia, “dentro de casa”.