Criado em 2013 por Thalita Meneghim e Gabie Fernandes, o canal de YouTube “Depois das Onze”, que conta com 3,2 milhões de seguidores, vai encerrar as atividades – e o anúncio dessa decisão, no dia 6 de maio, deu o que falar na web. Isso porque muitas pessoas que criam conteúdo estão desistindo da plataforma por causa da queda de ganhos e do baixo engajamento. A notícia levou o youtuber Felipe Neto a postar um desabafo nas redes, questionando o que será do futuro.
Tudo o que Felipe Neto diz vira notícia, porque ele é o youtuber com maior audiência do País e, no mês passado, entrou para a lista dos cinco maiores youtubers do mundo, depois de bater a marca de 44 milhões de inscritos em seu canal (algo inédito no Brasil). E essa reflexão dele sobre o caso também nos fez refletir. “Muito triste ver o canal ‘Depois das Onze’ encerrando as atividades. Muito triste ver cada vez mais canais de Youtube fechando ou despencando a audiência, enquanto uma nova geração inteira se forma baseada em conteúdos de até 30 segundos”, escreveu ele.
Desabafo do youtuber Felipe Neto questiona imediatismo de novas gerações
De fato, o mundo está mais veloz, e o fenômeno TikTok, que consolidou um novo tipo de linguagem, de vídeos cada vez mais curtos, ágeis e engraçadinhos, já domina todas as experiências nas redes. Segundo pesquisa da GWI, focada em comportamento de consumo, vídeos curtos, de até 4 minutos, já são os mais assistidos por todas as gerações (incluindo os baby boomers, que nasceram entre 1946-1964).
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Fonte: Instagram @rkiso, com dados da GWI
Claro que muito desse fenômeno tem a ver com o “efeito dopamina” provocado pelo formato de feed infinito (aquele que você rola, rola e… não acaba nunca, sempre com uma sugestão nova de vídeo pensado para você pelo algoritmo) do TikTok e do Reels. É a estratégia perfeita para fazer com que o usuário não abandone as redes tão facilmente. Isso explica por que 58% dos brasileiros concordam totalmente que, ao começar a assistir a um Reels, acabam vendo vários na sequência, de acordo com a pesquisa “Instagram no Brasil”, realizada em janeiro, pela Opinion Box.
Mas são inúmeros os exemplos de que a velocidade dos conteúdos tem aumentado juntamente com a falta de paciência das pessoas para consumir mensagens longas e em ritmos mais contemplativos.
Não à toa, segundo o WhatsApp, o acelerador de mensagens de voz (lançado em maio de 2021) era uma das funções mais solicitadas pelos usuários, por possibilitar que as pessoas ganhem tempo. No Telegram, principal rival do WhatsApp, o recurso permite acelerar não apenas mensagens de voz, mas também áudios encaminhados.
Pelo mesmo motivo, cada vez mais plataformas de streaming têm oferecido ferramentas de speed watching, que permitem alterar o ritmo do que se assiste ou se escuta. Na Netflix, é possível ver um filme ou série com até o dobro da velocidade original. As possibilidades são as mesmas no Youtube, para gravações no Google Meet e no Zoom, e em streamings de música, como a Deezer (cliente da Ecomunica). Isso estende a funcionalidade para podcasts, palestras e até aulas online.
A ansiedade, para além das redes
Esse comportamento de consumo de conteúdo acelerado afeta também o mercado fonográfico. O fenômeno que vem sendo chamado de “audição ansiosa” tem feito as músicas ficarem mais curtas e “objetivas”. Em reportagem do O Estado de S. Paulo, o jornalista Julio Maria comprova, com dados das plataformas de streaming e entrevistas com artistas e produtores musicais, que os jovens hoje não ouvem músicas com mais de dois minutos e meio de duração até o fim.
“Além das facilidades do streaming, a geração nova é bombardeada por informações rápidas ao mesmo tempo. Stories são de 15 segundos, músicas para o TikTok têm um minuto, o Twitter aceita pouco texto. Se sua música não for direto ao ponto, você perde esse ouvinte”, disse ao Estadão Tiago da Cal Alves, o Papatinho, DJ, beatmaker e produtor de artistas como Anitta, Ludmilla, Marcelo D2, Seu Jorge, Criolo e Black Alien. Ele também disse que a tendência é diminuir ainda mais o tempo das canções. “Prefiro ter uma música de dois minutos ouvida por duas ou três vezes pela mesma pessoa a ter uma de quatro que ninguém ouve. Tento bater os dois minutos e meio, estourando.”
Na mesma reportagem, Lulu Santos revelou que, recentemente, precisou cortar o tempo da sua música Inocente, mas gostou do resultado.
O comportamento de consumo de conteúdo veloz tem impactado inclusive a experiência dos clientes: o tempo de atendimento tolerado pelos consumidores vem caindo, segundo o estudo CX Trends 2022, da Opinion Box e Octadesk. No ano passado, a maioria da população brasileira esperava ser atendida em até quatro horas pelas marcas (juntando todos os canais de atendimento, como WhatsApp, redes sociais, e-mail, chat e telefone). Neste ano, a pesquisa mostrou que esse tempo máximo caiu para uma hora. Sendo que, o tempo médio tolerado, segundos os respondentes, seria:
- 80% em até 10 minutos nos chats online
- 78% em até 10 minutos no telefone
- 70% em até 10 minutos nos apps de mensagem, como WhatsApp
- 76% em até 1 hora nas redes sociais
- 73% em até 4 horas no email
Agora o mundo é só dos vídeos curtos?
Sabe essa sensação de ansiedade que você está sentindo ao ler tudo isso? Pois é: ela bateu forte por aqui também. Sem dúvida, os conteúdos rápidos, principalmente vídeos curtos e ágeis, são linguagens com as quais as marcas precisam se familiarizar.
Mas a nossa função como agência de comunicação integrada é ter um olhar mais global para esses fenômenos. Nesse caso, a máxima “para toda corrente, há uma contracorrente” é real. Não se pode negar que, na outra ponta dessa tendência, há um comportamento oposto em alta no mercado: o slow content, que preza mais qualidade e menos quantidade nos conteúdos, além de aprofundamento nas informações e análises.
Não é por acaso que as newsletters, os textões no Instagram e as threads do Twitter estão com tudo.
Além disso, embora os vídeos curtos sejam a preferência da vez, os vídeos longos ainda têm seu lugar. Quem está no chamado “topo do funil de vendas” talvez não queira gastar muito tempo assistindo ou consumindo conteúdo sobre aquilo que não conhece. Mas quando há uma real intenção ou decisão de compra, as pessoas tendem a dar muito mais atenção aos conteúdos longos, como vídeos com mais de quatro minutos, lives, podcasts, textos em blog etc.
Assim, TikTok e Reels se tornaram ótimas plataformas para quem quer descobrir novos produtos e serviços. Também são “o” lugar para quem vende produtos que as pessoas compram por impulso, sabe? Já o YouTube atende ao público que está em busca de algo, oferecendo tutoriais e review de produtos, por exemplo, além de outros conteúdos mais aprofundados.
Para decidir o melhor formato, é fundamental que as marcas façam pesquisas periódicas para conhecer muito bem o seu público, tendo em vista, inclusive, que seu comportamento pode ter mudado ao longo dos últimos dois anos. Afinal, qual a real necessidade dessa audiência? Em que momento da jornada de compra ela está?
A regra de um bom roteiro, porém, vale para qualquer um dos formatos: é preciso engajar logo nos três primeiros segundos, criar um storytelling que encadeie as ideias e encante ao longo do vídeo e fechar com algo marcante. E, acima de tudo, saber que, sem um conteúdo verdadeiramente útil, que informe, entretenha ou inspire as pessoas, não há formato, curto ou longo, que dê jeito de fisgar uma audiência.